É possível realmente transformar uma empresa sem priorizar mudanças nos aspectos mais fundamentais de seu funcionamento?
E se os indivíduos tivessem a autonomia para atualizar dinamicamente os processos, as expectativas e até mesmo a estrutura da empresa enquanto o trabalho é feito, sem causar danos em outros pontos?
Estas são as questões centrais que deram vida a Holacracia, o sistema de gestão criado por Brian J. Robertson no início desta última década, e em processo de adoção desde 2019 aqui na Upside.
Qualquer pessoa ao perceber que algo não está funcionando ou poderia ser melhorado em sistemas convencionais (me refiro ao modelo predominante, hierárquico de como uma empresa deve ser estruturada e administrada) logo se frustra quando percebe que não há muito a fazer, pelo menos não sem um esforço heroico para vencer burocracias e políticas internas.
Por exemplo, uma nova técnica para conduzir reuniões ajuda e incentiva uma equipe, mas em paralelo, seus integrantes continuam a ser constrangidos pela estrutura de poder fora da sala de reuniões, ainda disseminada pela empresa toda. No pior dos casos, em pouco tempo a nova técnica (esta entidade estranha que não se encaixa no modelo) é rejeitada.
E se pudéssemos transformar estas percepções em mudanças significativas sem que tivéssemos diante de nós grandes obstáculos para fazermos isso?
Sistema operacional dinâmico
Pense o modo como o poder e a autoridade são definidos e exercitados, quem pode esperar o que de quem, ou quem pode tomar quais decisões dentro de quais limites. Quando realizamos mudanças nessa camada, estamos efetivamente alterando o nível mais fundamental de uma empresa e introduzindo novas capacidades no seu sistema operacional.
Para quem possui idade suficiente, lembre o salto evolutivo que foi dado com um novo sistema operacional como foi o caso do Windows em comparação ao MS-DOS. Com frequência ignoramos um bom sistema operacional, sempre invisível, que dá forma a tudo que é realizado na superfície. O sistema operacional do nosso computador define as regras fundamentais segundo as quais tudo o mais é realizado. Além disso, define como os processos interagem, como o poder é distribuído e alocado entre os aplicativos e assim por diante.
É fácil ignorar o sistema operacional de uma empresa, mesmo sendo o alicerce sobre o qual construimos os processos do nosso negócio. Talvez por isso não costumamos questionar ou pensar em alternativas em relação a este sistema moderno, hierarquizado, de previsão e controle, no qual o “CEO é o responsável”. Mas assim como muitos aplicativos não rodariam bem no MS-DOS, os novos processos e mudanças culturais que tentamos adotar não funcionam muito bem em um sistema operacional construído sobre este paradigma.
Integrando todas as perspectivas
E por fim, a estrutura e os processos (e até mesmo a cultura) implícitos neste sistema atual não possibilitam o processamento rápido e as respostas necessárias para se aproveitar integralmente o poder de todos os indivíduos, seja qual for a conduta dos líderes.
É por meio da capacidade inata do ser humano de perceber a realidade à nossa volta que as empresas tomam consciência do que oferecer ao mundo. E nós, humanos, somos todos diferentes uns dos outros, e por isso percebemos também os fatos de maneiras distintas. Portanto, onde existem múltiplos indivíduos, existem múltiplas perspectivas, que geralmente não são compartilhadas pelos líderes ou pela maioria, pois é preciso manter o rumo ou seguir em frente, de uma forma ou de outra.
Como bem diz Malcom Gladwell em O que se passa na cabeça dos cachorros – Se todo mundo tem de pensar fora da caixa, talvez seja a caixa que precisa de conserto.